“Atravessar hoje a Porta Santa
nos compromete a adotar a misericórdia do bom samaritano”: este é o espírito
com o qual se deve viver o Jubileu Extraordinário, conforme disse o Papa
Francisco na missa celebrada por ocasião da Festa da Imaculada Conceição
(08/12), na Praça S. Pedro.
Com a cidade de Roma blindada
e um forte aparato de segurança, com três mil agentes nas ruas da capital, o
afluxo de peregrinos começou na madrugada nos arredores da Praça, que foi
aberta às 6h30. Os controles policiais, com a passagem pelo detector de metais,
tardaram o ingresso dos fiéis. Cerca de 50 mil pessoas participaram da
celebração.
Pecado e graça
Na homilia que antecedeu a
abertura da Porta Santa, o Pontífice recordou o mesmo gesto realizado em Bangui
(Rep. Centro-Africana) e ressaltou a primazia da graça: “A festa da Imaculada
Conceição exprime a grandeza do amor divino. Deus não é apenas Aquele que
perdoa o pecado, mas, em Maria, chega até a evitar a culpa original, que todo o
homem traz consigo ao entrar neste mundo. É o amor de Deus que evita, antecipa
e salva”.
A própria história do pecado
só é compreensível à luz do amor que perdoa, explicou o Papa. “Se tudo
permanecesse relegado ao pecado, seríamos os mais desesperados entre as
criaturas. A promessa da vitória do amor de Cristo encerra tudo na misericórdia
do Pai.”
Também este Ano Santo
Extraordinário é dom de graça, prosseguiu Francisco. “Entrar por aquela Porta
significa descobrir a profundidade da misericórdia do Pai que a todos acolhe e
vai pessoalmente ao encontro de cada um. É Ele que nos procura, que vem ao
nosso encontro. Neste Ano, deveremos crescer na convicção da misericórdia.”
Para o Pontífice, é preciso
antepor a misericórdia ao julgamento, se quisermos ser justos com Deus.
“Ponhamos de lado qualquer forma de medo e temor, porque não corresponde a quem
é amado; vivamos, antes, a alegria do encontro com a graça que tudo transforma”,
exortou.
Concílio Vaticano II
Em sua homilia, o Papa fez um
paralelo com outra porta “escancarada” 50 anos atrás pelos Padres conciliares.
O Concílio, afirmou, foi primariamente um encontro; um encontro entre a Igreja
e os homens do nosso tempo.
“Trata-se, pois, de um impulso
missionário que, depois destas décadas, retomamos com a mesma força e o mesmo
entusiasmo. O Jubileu exorta-nos a esta abertura e obriga-nos a não transcurar
o espírito que surgiu do Vaticano II, o do Samaritano, como recordou o Beato Paulo
VI na conclusão do Concílio. Atravessar hoje a Porta Santa compromete-nos a
adotar a misericórdia do bom samaritano.”
Porta Santa
Após a comunhão, teve início o
rito de abertura da Porta Santa, na entrada da Basílica de S. Pedro. O diácono
convidou os fiéis para a inauguração do Jubileu Extraordinário da Misericórdia
com estas palavras: “Abre-se diante de nós a Porta Santa. É o próprio Cristo
que, através do mistério da Igreja, nos introduz no consolador mistério do amor
de Deus".
Em procissão, os concelebrantes
se posicionaram na entrada da Basílica. Também estava presente o Papa Bento
XVI. Diante da Porta Santa, o Pontífice fez uma oração e recitou a
seguinte fórmula: “Esta é a porta do Senhor. Abri-me as portas da justiça. Por
tua grande misericórdia entrarei em tua casa, Senhor”.
O Santo Padre abriu a Porta
Santa e se deteve em silêncio em sua entrada. Francisco entrou por primeiro na
Basílica de S. Pedro, seguido por Bento XVI, pelos concelebrantes e por alguns
representantes de religiosos e fiéis leigos – momento em que foi entoado o Hino
do Ano Santo da Misericórdia. No Altar da Confissão, o Papa fez uma oração
e concedeu a todos a sua bênção apostólica.
Francisco: Nossa Senhora,
aurora da nova criação
Após abrir a Porta Santa da
Basílica de São Pedro e iniciar assim o Jubileu da Misericórdia, o Papa recitou
a oração mariana do Angelus a partir da janela do Palácio Apostólico.
Abaixo, publicamos a íntegra
da alocução de Francisco.
***
Caros irmãos e irmãs, bom dia!
A Solenidade da Imaculada
Conceição nos faz contemplar Nossa Senhora que, por singular privilégio, foi
preservada do pecado original desde a sua concepção. Mesmo vivendo em um mundo
marcado pelo pecado, este não a macula: é nossa irmã no sofrimento, mas não no
mal e no pecado. Aliás, nela, o mal foi derrotado antes mesmo que pudesse se
aproximar dela, porque Deus a revestiu de graça. (cfr Lc 1,28);
A Imaculada Conceição
significa que Maria é a primeira a ser salva pela infinita misericórdia do Pai,
como premissa de salvação que Deus quer doar a cada homem e mulher, em Cristo.
Por isso, a Imaculada passou a
ser ícone sublime da misericórdia divina que venceu o pecado. E nós, hoje, no
início do Jubileu da Misericórdia, queremos olhar para este ícone com amor
confiante e contempla-la em todo o seu esplendor, imitando a sua fé.
Na concepção imaculada de
Maria somos convidados a reconhecer a aurora do novo mundo, transformado pela
obra salvífica do Pai e do Filho e do Espírito Santo. A aurora da nova criação
feita pela divina misericórdia. Por isso a Virgem Maria, jamais contaminada
pelo pecado e sempre recoberta de Deus, é mãe de uma nova humanidade.
Celebrar esta festa comporta
duas coisas: acolher plenamente Deus e a sua graça misericordiosa na nossa
vida; a nossa vez, sermos artífices de misericórdia mediante um autêntico
caminho evangélico.
A festa da Imaculada se
transforma então em festa de todos se, com os nossos “sim” quotidianos,
conseguimos vencer o nosso egoísmo e tornar mais contente a vida de nossos
irmãos, a doar-lhes esperança, secando algumas lágrimas e doando um pouco de
alegria.
A exemplo de Maria, somos
chamados a nos transformar em operadores de Cristo e testemunhas de seu amor,
mirando antes de tudo àqueles que são privilegiados aos olhos de Jesus.
São aqueles que Ele mesmo nos
mostrou: “Pois tive fome e me destes de comer. Tive sede e me destes de beber.
Era forasteiro e me recolhestes. Estive nu e me vestistes, doente e me
visitastes, preso e viestes ver-me”. (Mt 25, 35-36)
A solenidade da Imaculada
Conceição tem uma mensagem específica para nós: nos lembra que em nossa vida tuto
é dom, tudo é misericórdia. A Virgem Santa, primícias dos salvos, modelo da
Igreja, esposa santa e imaculada, amada pelo Senhor, nos ajude a redescobrir
sempre mais a misericórdia divina como distintivo do cristão. Ela é a
palavra-síntese do Evangelho. É o detalhe fundamental do rosto de Cristo:
aquele rosto que nós reconhecemos nos diversos aspectos da sua existência:
quando vai ao encontro de todos, quando cura os doentes, quando se senta à mesa
com os pecadores e, sobretudo, quando, pregado na cruz, perdoa; ali vemos o
rosto da misericórdia divina.
Por intercessão de Maria
Imaculada, a misericórdia tome conta dos nossos corações e transforme toda a
nossa vida.
Francisco inaugura o 29º
Jubileu da história da Igreja
O Papa Francisco inaugurou o
29º Jubileu da história da Igreja Católica – um Ano Santo extraordinário
centrado no tema da Misericórdia que decorre até 20 de novembro de 2016.
O Jubileu da Misericórdia teve
início com a abertura da Porta Santa na Catedral de Bangui, na República
Centro-Africana, no dia 29 de novembro.
Neste dia 8 de dezembro, foi a
vez da abertura da Porta Santa da Basílica de São Pedro, algo que não acontecia
desde 2000.
Esta porta é aberta apenas
durante o Ano Santo, permanecendo fechada no restante do tempo, e existem
portas santas nas quatro basílicas papais: São Pedro, São João de Latrão,
São Paulo fora de muros e Santa Maria Maior.
O anúncio solene do Ano Santo
teve lugar com a leitura e publicação da bula pontifícia (Misericordiae
Vultus), junto da porta de São Pedro, no Domingo da Divina Misericórdia (12 de
abril).
Tradição
A Igreja Católica iniciou a
tradição do Ano Santo com o Papa Bonifácio VIII, em 1300, e a partir de 1475
determinou-se um jubileu ordinário a cada 25 anos.
Até hoje, houve 26 Anos Santos
ordinários e dois extraordinários (anos santos da Redenção): em 1933 (Pio IX)
e 1983 (João Paulo II).
O jubileu consiste num perdão
geral, uma indulgência aberta a todos, e na possibilidade de renovar a relação
com Deus e o próximo. Esta indulgência implica obras penitenciais, como
peregrinações e visitas a igrejas.
Fotos: ANSA / AFP